domingo, 4 de junho de 2023

8 Cozinha argentina: Dulce de leche 21/Mai/2008 | Jornal Público

O Moscatel de Setúbal nas suas sete quintas


Vai já longe o tempo em que ninguém dispensava um vinho licoroso com a sobremesa. Adormecido - espera-se com algum desespero que seja por pouco tempo mais – o costume abandonou-se, tendo passado a um registo caro e raro a prática do Porto ou Madeira no final. Que é mau para a saúde; que tem muito álcool; que engorda; ou mesmo que é perigoso; de todas as “razões” se muniram com o tempo as pessoas, para justificar o abandono de, mais do que uma bebida alcoólica, um verdadeiro património. Aclamado pelo mundo fora, o fabuloso leque de vinhos generosos portugueses – Porto, Moscatel e Madeira – não tem no seu próprio território a clientela mais fiel. E enquanto países vinhateiros, tais como a Austrália ou os EUA, tentam produzir por exemplo “vinhos tipo Porto” sem raiar sequer a qualidade do produto genuíno, tardam os lusitanos em render-se aos encantos dos grandes expoentes desta arte.

A receita argentina que reproduzimos hoje é a de uma das mais simples sobremesas do mundo. Como são sempre simples as grandes receitas, desde que apoiadas nos ingredientes certos. O “Dulce de Leche”, ou Doce de Leite não foge a essa regra de ouro e talvez por isso atinja expoente elevado na Argentina. Onde há boas vacas há também bom leite e, existindo um lume muito brando – no chão, no fogão ou num fogareiro -, depressa se faz o dulce de leche. No entanto, apesar de toda a tradição crioula primeiro, citadina depois, já são muito poucas as casas argentinas onde se continua realmente a fazer este doce, pela paciência e longanimidade que exige do cozinheiro. Tudo se passa na quase-fervura e tudo urge fazer-se para que toda a amálgama – leite e açúcar, principalmente – não se pegue ao fundo do tacho. No entanto, como com todas as coisas boas da vida, há que experimentar pelo menos uma vez. Há também que encontrar o leite inteiro mais próximo possível do primevo; aquele que ao pequeno-almoço dava energias para o resto do dia ou que ao deitar garantia um sono profundo. Será mais fidedigno o resultado final e bem mais sápido. Pretendendo apenas testar a conjugação vinho-comida que propomos, encontra-se nas boas confeitarias e nos bons supermercados oferta relativamente séria deste tipo de doce.

Tal como foi apresentada por Miguel Soares, do El Último Tango, em Lisboa, a sobremesa consta de Flan com Dulce de Leche. É um “dois em um” que, no aspecto da harmonização com vinho, faz toda a diferença. O Moscatel JP da Bacalhôa Vinhos (xxx Euros num supermercado), fresco, vibrante e sobretudo novo para um Moscatel de Setúbal, entrou muito bem no doce de que passamos a receita. A “ponte doce” entre o prato e o vinho foi de grande sintonia, com a vantagem da acidez do vinho reciclar o palato. As notas aromáticas de casca de laranja que se encontram neste francamente democrático e recomendável moscatel conferem mais interesse ainda ao conjunto. Tudo muda, contudo, com a prova do flan, o que se compreende. A proteína principal passa a ser o ovo – base do flan – e para esse a competência líquida deixa de ser plena. O que fazer? Experimentar um vinho mais evoluído, com mais madeira e idade. Tínhamos levado, à cautela, uma garrafa de amostra de casco de um Moscatel de Setúbal de Setúbal Superior 1990 feito por quem os fez praticamente todos até hoje. A experiência foi bem sucedida, uma vez mais a demonstrar que nas coisas do vinho e da comida não há certezas.




Ingredientes

300g de Açúcar

1l de leite

Baunilha em vagem, qb

¼ de colher de café de Bicarbonato de Sódio


Preparação

Abre-se as vagens de baunilha, retirando as sementes. Levar o leite com o açúcar, baunilha e bicarbonato de sódio a ferver. Mantém-se o lume alto para que o leite ganhe cor. Quando esta começa a escurecer, põe-se o lume muito brando, mexendo sempre. O doce está pronto quando fica espesso. Guarda-se em frascos.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.