domingo, 4 de junho de 2023

12 Cozinha japonesa: Salada de pepino com polvo 3/Jun/2008 | Jornal Público

Encruzado em desafio marítimo

A conjugação de vinhos com comida é repleta de subtilezas e gostos particulares, repartindo-se normalmente por um de dois caminhos: complementaridades e afinidades. No primeiro incluem-se os opostos doce-salgado e gordo-ácido, por exemplo, e visa-se a entrega recíproca de uns a outros para atingir harmonia e neutralidade. No segundo, parte-se de uma qualquer nota aromática ou de sabor comum ao prato e ao vinho, que se utiliza como ponte e potenciadora do enriquecimento do conjunto, criando complexidade e um ambiente uno para as componentes líquida e sólida.

Na experiência que hoje propomos, o ponto de partida foi deliberadamente o vinho, um Quinta do Cerrado Encruzado 2007 (Dão). Trata-se de um vinho integralmente produzido a partir da emblemática casta branca Encruzado, autóctone da região do Dão, que é também o terroir em que melhor se mostra. Complexo e fresco, é um vinho “sério” e estruturado que apresenta cambiantes curiosas de comportamento quando servido a temperaturas diferentes. A 11ºC, por exemplo, mostra-se citrino, vibrante e fácil de beber, mesmo sem acompanhamento sólido. Já a 13ºC, temperatura um pouco alta para um vinho branco, revela uma exuberância aromática fora do vulgar, a pedir um prato bem pensado. Notas salgadas e de cogumelos cristalizam-se no palato e no nariz com muita definição e foi nelas que pegámos para propor ao chefe Paulo Morais a definição de um prato. Optámos, já se vê, pelo caminho das afinidades e conversámos com o especialista de culinária oriental acerca do que poderia funcionar com as nuances do nosso vinho branco. Sugerimos algas e marisco, mas a sabedoria do chefe elevou a parada, ao propor “makis” (rolos) de pepino e polvo, com as algas servidas em salada. Mais que não fosse pelo gozo de assistir à preparação do prato, verdadeiro festival de perícia e sageza, valeu a pena o desafio.

O pepino japonês difere do que vulgarmente utilizamos entre nós essencialmente na polpa. A deste é fibrosa e rija, enquanto que a daquele é mais macia e farinhenta. Cria, assim, maior maneabilidade e consistência. O sabor é próximo, igualmente rico em sais e marcadamente mineral, talvez um pouco menos intenso. Há pois que procurar encontrá-lo, o que se consegue nalguns supermercados. A manobra de “estender” o pepino é a mais importante e consiste, basicamente, em pegar num toro do pepino e andar com a faca em volta, em espiral muito fina. Fica uma esteira de pepino que se utiliza depois para enrolar, à maneira do maki-sushi, entremeando com polvo cozido cortado em carpaccio.

As algas têm raiz muito profunda na cultura japonesa, fazendo parte da dieta quotidiana dos seus habitantes desde há mais de 4 mil anos. A alga “nori” é a utilizada para enrolar sushi, por exemplo. Na salada que nos propôs, Paulo Morais utilizou um conjunto de algas que dá pelo nome de “kaisou” e que contém, entre outras, wakamur, agar-agar, kumbu e alface do mar. A mistura é elegante, forte em iodo e notas vegetais. O molho de miso que foi colocado no topo de cada rolo deu uma tonalidade agridoce ao prato. Funcionou bem o nosso Encruzado, resolvendo, como se pretendia, as notas comuns com o prato, exacerbando a proteína principal, neste caso o polvo.



Ingredientes


Pepino japonês

Polvo cozido

Algas japonesas frescas

Molho de miso


Preparação


Descasca-se o pepino e corta-se em toros de cerca de 10cm. Depois, com uma faca bem afiada, lamina-se o toro no sentido da rotação deste, garantindo que se vai obtendo uma película muito fina e contínua, com cerca de 30cm de comprimento. Estende-se sobre uma superfície limpa. O polvo deve estar bem tenro e não demasiado cozido. Corta-se em carpaccio e estende-se ao longo da esteira de pepino. Depois enrola-se com cuidado, utilizando a mesma técnica que para enrolar sushi. Corta-se em pequenos toros, que se dispõem no prato com uns pingos de molho de miso no centro. Serve-se com a salada de algas à parte.

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