domingo, 4 de junho de 2023

37 Cozinha baiana: Bobó de camarão 17/Dez/2008 | Jornal Público

Bobó de Camarão


Foi há mais de 500 anos que Pedro Álvares Cabral, erraticamente, acostou no destino baiano que logo baptizou como Porto Seguro. Esse instante lavrou um marco fundamental na relação entre O Brasil e Portugal, para não mais ser interrompido. O testemunho mais importante é, obviamente a língua, seguido de muito perto pela gastronomia. Relatos de Pêro Vaz de Caminho apontam para aspectos de descoberta de grande ingenuidade. Caso dos “palmitos”, por exemplo, afirmando que havia “muitas palmeiras, não muito altas, e muito bons palmitos”. Mais adiante, chega a dizer “colhemos e comemos muitos deles”, que cedo se percebeu serem, afinal, bananas. Também chamou inhame ao que o não era; esse viria depois, das portuguesas ilhas de Cabo Verde e da distante Ásia. Foi certeiro no camarão, que o era, de facto, apesar de processado segundo técnicas diferentes das nossas e com sabores também eles diversos. Perante os povos totalmente nus, com as “vergonhas” à mostra, admirou-se o cronista com o estado de saúde dos índios locais, “tão rijos e tão nédios que não o somos nós tanto”.

As comidas, precipitadamente consideradas primitivas, eram, reflectindo um pouco mais, nutridoras e eficientes, afinal. É conhecida, de resto, a renúncia dos índios aos pratos de substância que os portugueses comiam e ofereciam; não lhes tocavam. Pão; peixe cozido; frutas confitadas; mel, figos secos; foram particularmente mal sucedidos no processo de sedução que os lusos sempre tentaram utilizar para obter a confiança dos povos indígenas que encontraram. Com o tempo, no entanto, vingaram, por exemplo o leitão assado frio, o arroz e o vinho. Este último tornou-se particularmente agradável às populações primevas da “terra do pau-brasil”, definitivamente baptizada como Brasil. De quase se recusarem a aproximar-se das galinhas, passaram, em menos de 50 anos, a consumir essas aves de capoeira, integrando-a nos seus temperos e preparações. O bobó, de que hoje falamos, um dos preparados mais emblemáticos da Baía, com base num puré de mandioca cozida, passou também a oferecer frango como proteína. Mas, se quisermos olhar historicamente para o prato, há que olhar para o seu formato “original”.

Para acompanhar esta comida nutridora do corpo e da alma, escolhemos um vinho que, a um tempo, consegue ligar com o bobó como poucos e vai contra a corrente. É um branco, da lavra do duriense Domingos Alves de Sousa e é o seu Reserva Pessoal 2003. De cor alaranjada, com notas consideráveis de evolução, se colocado em torno dos 14ºC – portanto mais quente do que um branco normal – é um casamento luso-brasileiro indestrutível e a toda a prova. O acidulado do vinho e as suas notas de boca maduras, encontram contrapeso sempre equilibrado, mesmo quando se lhe acentua o picante. Não conseguimos pensar em conjugação mais feliz, pelo que o nosso conselho vai no sentido de deixar cair o preconceito de que os brancos devem ser “bonitinhos” e frutados. Provar este vinho especial com o bobó do Comida de Santo é uma grande experiência.



Ingredientes

(4 pessoas)

500g Mandioca

400g Miolo fresco de camarão

1L Leite de coco

Óleo de palma, a gosto

Sal e pimenta preta q.b.


Preparação

Cozer a mandioca no leite de coco e fazer puré. Numa frigideira juntar 2 colheres de sopa de óleo de palma (a gosto) e saltear a cebola picada. Adicionar o camarão até ficar rosado, juntar o puré de mandioca e temperar com sal e pimenta preta a gosto. Servir com arroz branco e farofa de dendêm (óleo de palma).


Farofa

Aquecer um pouco de óleo de palma numa frigideira e juntar farinha de mandioca e temperar com um pouco de sal.


Leite de coco

Ferver um litro de água e juntar um pacote de 200g de coco ralado, bater no liquidificador e coar.


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