Alentejano inovador para um prato de sempre
Escolher um vinho para um estufado obriga à prova e sobretudo ao estudo da receita. Sendo de base refogada, como é o caso da “Carbonada Crioula” que aqui apresentamos, a escolha recai normalmente num vinho tinto encorpado e bem maduro. Se a fórmula vínica só por si nos leva para o Alentejo, a escolha nem por isso é fácil. O Alentejo é muito vasto e os seus vinhos cobrem Portugal de lés a lés, apresentando desde a frescura atlântica até à grande concentração de fruta que caracteriza o interior raiano. A este leque bem colorido de vinhos diferentes, juntamos mais uma variável e encostamo-nos ao limite sul da província alentejana. Têm vindo a aparecer vinhos “gulosos” no paralelo de Castro Verde que se têm distinguido também pelo seu equilíbrio e frescura. Ganhadores sistemáticos de prémios dentro e fora do país, reflectem uma região até há bem pouco tempo adormecida, à espera de quem lhes enaltecesse as virtudes. O Herdade dos Grous 2006 foi o vinho que finalmente escolhemos para acompanhar mais uma receita de Miguel Soares, do El Último Tango, o pequeno templo da gastronomia implantado no Bairro Alto.
O prato em si mesmo tem origem no lume de chão – fogueira a campo aberto ou sobre a pedra de um fogão de sala – que ao longo dos séculos serviu para amaciar as carnes mais fibrosas e teimosas que sobravam das ricas “parriladas”. Requentado, era e ainda é uma das soluções mais populares para a alimentação quotidiana das famílias argentinas. A sua origem campesina é inegável, bem como a inspiração mediterrânica, já que a base da carbonada é um refogado em azeite vivo, por onde passam carne e cebola antes de se trabalhar o estufado propriamente dito. Das influências europeias na cozinha argentina de que já aqui falámos, destacaríamos a espanhola ou a italiana, semelhantes – tal como a portuguesa – nas bases dos seus estufados e sopas. O tomate, a abóbora e o pêssego dão uma nota adocicada ao conjunto que nem picante nem sal conseguem disfarçar; há que fazê-lo com o vinho. Perante estas notas, seria de esperar, como se confirmou, que o Herdade dos Grous vingasse.
O autor principal de todos os vinhos da Herdade dos Grous é Luís Duarte, o enfant terrible que há uns anos deu início ao projecto da Herdade do Esporão, então sob os auspícios do grande e saudoso Joaquim Bandeira. Findo o seu trabalho no Esporão, chegou o desafio de fazer tudo de raiz, numa região diferente e nova, com tudo por fazer; até conquistar o respeito dos consumidores. A lógica da produção nos Grous é de disponibilizar desde cedo os vinhos aos apreciadores, saindo da adega prontos a beber, mas também apresentar potencial de envelhecimento. O Herdade dos Grous 2006, feito num ano que sabemos ter sido difícil, é o vinho mais “democrático” da casa, tendo custado ***** num supermercado. Dentro da gama dos vinhos de gosto consensual, consegue apresentar alguma irreverência, por conseguir captar a atenção dos palatos mais treinados.
Num prato com picos de sabor, caldoso e apurado, o Grous 2006 mostrou-se um ponto de referência interessante, mostrando nuances diferentes com cada um dos componentes da carbonada. A afinação com a proteína principal – a carne estufada – foi interessante, destacando de forma curiosa os temperos e os sabores ricos da carbonada. É fundamental servi-lo a não mais de 16ºC, para estimular o palato e ajudar à exploração do conjunto.
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Ingredientes
2 tigelas de carne de vaca para estufar
4 colheres de sopa de azeite virgem
1 cebola picada
1 tomate grande picado, sem grainhas
1 folha de louro
1 colher de sopa de polpa de tomate
1 chávena de chá de açúcar
1 tigela de caldo de carne
3 maçarocas de milho frescas, cortadas em rodelas finas
½ tigela de batata doce em cubos
½ tigela de batatas em cubos
½ tigela de pêssegos secos em quartos
Sal q.b.
Preparação
Alourar a carne em azeite muito quente, juntando-se depois a cebola. Com um lume um pouco mais brando, ir juntando o tomate, louro, polpa de tomate, açúcar, caldo e milho. Deixar cozer tudo em lume muito brando, em quase-fervura, temperando-se de sal quando começa a apurar. O lume apaga-se quando o resultado é caldoso e enquanto ainda se identificam visualmente os ingredientes. Serve-se com arroz branco.
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