quarta-feira, 21 de novembro de 2018

O Porto da alta restauração.

A complexa e pouco povoada área de fine dining do Porto deu lugar a uma efervescência talvez maior de talentos e projectos, a ponto de sentirmos a Invicta como capital nacional do gosto. Palpamos o terreno, com a ousadia que se espera e recomenda.

Num mundo perfeito, e numa leitura simplista dos acontecimentos dos dois últimos anos nos restaurantes do Grande Porto, a festa Michelin também acontece a Norte. O cenário está em constante remodelação, mas chegado o momento da eleição, há que fazer uma somatório rápido das experiências, ousadias e novidades sentidas. Nos candidatos à primeira estrela, começa a ser gritante o caso do Ferrugem, em Vila Nova de Famalicão, o chef Renato Cunha está com o seu restaurante há anos na categoria Bib Gourmand, não se entende que como não lhe tenha sido concedido entrar no universo superior. Vasco Coelho Santos, do Euskalduna Studio destaca-se pelo rigor culinário e afinação de sabores, numa sala onde tudo é feito à vista, sem véus, num ritmo certo e com ingredientes de grande nível, passando mesmo por lavradores e hortelões a trabalhar em exclusivo para a casa. João Cura, no Almeja, criou em menos de um ano um ambiente gastronómico inovador, com propostas de talante gigante, não seria a primeira vez que um restaurante tão recente ganhasse a primeira estrela, pelo que evocamos a excepção para produzir a regra. Parece inevitável a estrela para o Cozinha por António Loureiro, em Guimarães, matriz conceptual muito forte assente nos pilares da sustentabilidade, produto autêntico e lógica de aproveitamento total, vertidos em pratos deliciosos que nos alegram a alma. Outra primeira iria para o Paparico, de Sérgio Cambas, cujo entendimento com o chef Jonathan Seiller é total, criando um dipolo forte entre tradição e modernidade, do qual os grandes beneficiados somos nós. É mais que chegado o tempo do Palco, restaurante do Hotel Teatro, com o brilhante Arnaldo Azevedo a encenar diariamente um espectáculo culinário meticulosa e obsessivamente coreografado, por isso lhe daríamos uma estrela segura. Óscar Geadas fez com o seu irmão o impensável ao pegar no lugar único que é a Pousada de Bragança e transformá-la num espaço de retiro gastronómico de grande gabarito. E é o momento para reverenciar o chef Camilo Jaña, do Cafeína, pela inquietude e desinstalação, enquanto congrega uma clientela exigente à sua volta. A estrela na verdade, para estes mestres não representa motivação adicional nem é objectivo de vida; de certa forma a vida já lhas deu. Entramos no patamar superior da refeição perfeita quando falamos de Rui Paula, mente brilhante e grande empresário, fazer uma refeição na Casa de Chá da Boa Nova, em Leça da Palmeira, é toda uma viagem de que regressamos sempre com outros ângulos e perspectivas sobre o que a mesa pode ser. Do perfeccionista Vítor Matos, Do Vinvvm, o pensamento mais complexo pela obsessão com o detalhe, e sabemos que sempre sairão propostas surpreendentes e refeições incomparáveis. Pedro Lemos é na culinária nacional o atleta de alta competição que em cada prova se excede para lá do previsto e Tiago Bonito, erudito inconfesso que está aos fogões do Largo do Paço, em Amarante, já mostrou que continua com muito para dar e com a atitude de quem está no posto certo, maduro e pronto. Ricardo Costa, no Yeatman, é um dos poucos chefs habilitados a chegar ao topo da galáxia Michelin e trabalha num regime notável de concentração e energia, há-de ser um dos primeiros a lá chegar. Tem uma estrutura de grande nível hoteleiro com ele, o que para o objectivo supremo é determinante. O Norte merece e faz por merecer.

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